Mostra Retratistas do Morro será aberta na terça-feira (23)
Com curadoria do pesquisador Guilherme Cunha, a mostra apresenta uma visão panorâmica sociopolítica e cultural da vida cotidiana nas comunidades do Aglomerado da Serra (MG), a partir de 223 imagens registradas pelos fotógrafos Afonso Pimenta e João Mendes ao longo de décadas.
Com base em um extenso acervo fotográfico, Retratistas do Morro apresenta a vida cotidiana dos moradores do Aglomerado da Serra – segunda maior favela do país, localizada ao sul da capital mineira, Belo Horizonte – entre 1969 e 1990. Em abril, a exposição chega à programação do Sesc Guarulhos com a proposta de narrar e revisitar uma história recente de imagens brasileiras, com destaque para personagens invisibilizados na sociedade.
O olhar íntimo das festas, casamentos, batizados, formaturas e outros eventos retratados nessas imagens vem de Afonso Pimenta e João Mendes, fotógrafos membros e atuantes na própria comunidade. Com abertura em 23 de abril, às 19h, a exposição pode ser visitada gratuitamente por todos os públicos até o dia 25 de agosto, de terça a domingo.
A mostra, que chegou ao estado de São Paulo em 2023, com montagem no Sesc Pinheiros, é um desdobramento do trabalho social Retratistas do Morro, conduzido desde 2015 pelo artista visual e pesquisador Guilherme Cunha, curador da exposição. O projeto visa contribuir para a preservação do patrimônio histórico-cultural nacional e para a ampliação do entendimento sobre a história das imagens no Brasil, com ênfase em narrativas visuais produzidas principalmente por retratistas que atuaram nas comunidades, por meio do mapeamento, identificação, catalogação e restauração desses acervos fotográficos.
O início da pesquisa se constituiu em realizar um levantamento para identificação desse grupo de retratistas.
“Dentre os fotógrafos, com os quais passamos a conviver de forma mais próxima, se destacaram Afonso Pimenta e João Mendes; por estarem atuando na região desde o final da década de 1960, e pelo volume de seus acervos, entre negativos P&B de médio formato (6×6), negativos coloridos 35mm, monóculos e negativos de ½ 35mm’’, conta Guilherme.
Para conceber a mostra, Guilherme se aprofundou em mais de 250 mil negativos do acervo e em uma pesquisa sobre a história da comunidade. Desse montante, o recorte curatorial inicial estabeleceu 33 mil imagens passíveis de restauro e que traçam uma historicidade em imagens do Aglomerado da Serra.
Com a expografia assinada por Ricardo Amado, a montagem no Sesc Guarulhos da exposição apresenta 223 imagens, divididas em três temáticas que se misturam pelo espaço.
Sobre os fotógrafos
João Mendes, aos 8 anos, começou a trabalhar na roça com os pais. Em 1963 mudou-se para Ipatinga com a família, em busca de uma nova vida. Após passar por vários empregos e vender picolés de porta em porta, aos 15 anos iniciou sua trajetória na fotografia. Ainda nessa época, foi contratado pelo delegado de polícia da cidade para ser o fotógrafo oficial da perícia. Entre os deveres em casa e na escola, retratava cenas de crimes.
No dia 2 de agosto de 1973, João Mendes se estabeleceu como um dos primeiros fotógrafos profissionais no bairro Serra, em Belo Horizonte. No entanto, suas primeiras imagens da região datam de 1968. Desde então, sua loja Foto Mendes está localizada no mesmo local e é uma referência, pois por lá já foram fotografadas quatro gerações.
João ficou conhecido pelos retratos em preto e branco, 3×4 para documentos, feitos principalmente para carteira de identidade, e fotos postais enviadas por correio como cartas ou objetos de recordação a parentes que, muitas vezes, permaneciam no interior.
No acervo de João Mendes também pode ser encontrada uma significativa coleção de fotografias de becas ou formaturas, em que as crianças e jovens da Comunidade da Serra, estudantes da rede pública de ensino, foram fotografadas celebrando a passagem de diferentes períodos escolares.
Afonso Pimenta saiu do interior de São Pedro do Suaçuí em 1970, com destino a Belo Horizonte, para ajudar sua madrinha com as despesas da casa na favela do Cafezal, uma das vilas que formam a Comunidade do Aglomerado da Serra.
Por falta de emprego, passou uma temporada catando e vendendo esterco até ser contratado como gari pela prefeitura. A fotografia chegou à sua vida por necessidade. Como assistente do fotógrafo João Mendes, enquanto lavava as imagens já reveladas, ia aprendendo um futuro ofício.
Seu percurso como fotógrafo profissional começou a se consolidar quando passou a registrar os bailes Soul da Comunidade da Serra, a convite de Misael Avelino dos Santos, um dos fundadores da Rádio Favela e organizador dos bailes.
Ao longo da década de 1980, acompanhou os movimentos culturais da música e da dança que traziam a afirmação e força da identidade cultural negra em Belo Horizonte. Fotografou os concursos de dublagem, os salões, os dançarinos, grupos de amigos e viveu muito perto os bastidores do movimento “Black” que surgia na periferia.
Esse foi para ele o momento em que mais trabalhou com a fotografia, uma vez que o registro dos bailes era uma forma de divulgar seu nome entre os moradores da comunidade. Começou então a trabalhar, como ele mesmo define, “no corpo a corpo” – indo ao encontro das pessoas e caminhando pelo morro.
Sobre o curador
Guilherme Cunha é artista visual, pesquisador e empreendedor cultural formado em artes plásticas pela Escola Guignard (UEMG) e Pittsburg State University (KS/EUA).
A produção e projetos que desenvolve, atuam no campo de interseção entre as artes e outras diversas formas de conhecimento. Foi artista residente do Atelier #3 na Casa Tomada (SP/2010), do JA.CA (BH/ 2014) e do RedBull Station (SP/2014); Foi contemplado no programa de exposições do Espaço Cultural Marcantônio Vilaça em 2015, no XIII Prêmio FUNARTE Marc Ferrez de Fotografia e foi coidealizador do projeto que recebeu o XIV Prêmio FUNARTE Marc Ferrez de Fotografia.
É coidealizador e codiretor do FIF BH – Festival Internacional de Fotografia de Belo Horizonte (2013/2015/2017). Em 2017, recebeu o prêmio do IPHAN, de preservação do Patrimônio Cultural Brasileiro, Rodrigo Mello Franco de Andrade, com o projeto Retratista do Morro.
Serviço
Retratistas do Morro
- curadoria de Guilherme Cunha
- Abertura: 23 de abril, às 19h
- Visitação: de 23 de abril a 25 de agosto de 2024. Terça a sexta, das 9h às 21h30.
- Sábado, das 9h às 20h. Domingo e feriado, das 9h às 18h.
- Espaço Expositivo | Sesc Guarulhos
- Grátis. Livre.