Em material inédito, ex-cunhada afirma que presidente exigia grande parte dos salários dos parentes
Gravações inéditas obtidas pela colunista Juliana Dal Paiva, do UOL, e divulgadas nesta segunda-feira (5), apontam envolvimento de Jair Bolsonaro (sem partido) em um esquema ilegal de entrega de salários de assessores, conhecido como rachadinha.
Os áudios integram a investigação do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) sobre a mesma prática que configura o crime de peculato no gabinete do senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ), filho mais velho do presidente.
Segundo a reportagem, a declaração da fisiculturista Andrea Siqueira Valle, ex-cunhada do presidente, é o primeiro indício de envolvimento direto de Bolsonaro no esquema dentro de seu próprio gabinete no período em que foi deputado federal. Ele ocupou o mandato de parlamentar na Câmara dos Deputados entre os anos de 1991 e 2018.
Andrea é irmã de Ana Cristina Siqueira Valle, segunda esposa de Bolsonaro, e foi a primeira dos 18 parentes da segunda mulher do presidente que foram nomeados em um dos três gabinetes da família Bolsonaro: Jair, Carlos e Flávio – no período de 1998 a 2018.
Em um dos trechos, Andrea afirma que o irmão André Valle foi tirado do esquema por não devolver a maior parte do salário que recebia. Ele foi assessor de Bolsonaro entre 2006 e 2007.
“O André dava muito problema porque o André nunca devolveu o dinheiro certo que tinha que ser devolvido, entendeu?. Tinha que devolver R$ 6 mil, o André devolvia R$ 2 mil, R$ 3 mil. Foi um tempão assim até que o Jair pegou e falou: ‘Chega. Pode tirar ele porque ele nunca me devolve o dinheiro certo’”, diz Andrea.
Em outro trecho, um dos áudios revela a partir de conversas da família de Fabricio Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro, que Jair Bolsorao é o verdadeiro “01”.
“Em troca de mensagens de áudio, a mulher e a filha de Fabrício Queiroz, Márcia Aguiar e Nathália Queiroz, chamam Jair Bolsonaro de “01”. Márcia afirma que o presidente “não vai deixar” Queiroz voltar a atuar como antes”, afirma o UOL.
Além de Queiroz, um coronel da reserva do Exército, ex-colega do presidente na Aman (Academia Militar das Agulhas Negras), Guilherme dos Santos Hudson, atuou no recolhimento de salários da ex-cunhada de Jair Bolsonaro.
“O tio Hudson também já até tirou o corpo fora, porque quem pegava bolada era ele. Quem me levava e buscava no banco era ele”, aponta Andrea.
Em parte do trecho obtido pelo UOL, Andrea fala que possui informações que podem prejudicar a família Bolsonaro.
“Não é pouca coisa que eu sei não, é muita coisa, que eu posso ferrar a vida do Flávio, posso ferrar a vida do Jair, posso ferrar a vida da Cristina, entendeu? É por isso que eles têm medo aí e manda eu ficar quietinha, não sei o que, tal. Entendeu? É esse negócio aí”, afirma Andrea.
O advogado Frederick Wassef, que representa o presidente e proprietário do imóvel onde Queiroz se escondeu em Atibaia, negou ilegalidades e ainda afirmou que existe uma antecipação da campanha presidencial de 2022.
A defesa de Flávio Bolsonaro disse, em nota, que as “gravações clandestinas, feitas sem autorização da Justiça e nas quais é impossível identificar os interlocutores não é um expediente compatível com democracias saudáveis”.
Os advogados de Queiroz e da esposa não responderam ao UOL. Ana Cristina Valle e sua família, além de Guilherme Hudson, decidiram não se pronunciar.
Os áudios podem ser ouvidos no vídeo abaixo. O material também faz parte do podcast “UOL Investiga – A Vida Secreta de Jair”, que será lançado nesta terça-feira (6). O conteúdo estará disponível no UOL, no YouTube e distribuidores de podcast.